domingo, junho 14, 2009

gostar, gostar e gostar?

Conversando outro dia com minha amiga Marcia B chegamos juntas à conclusão de que ambas sofremos do "mal do desamparo". Por alguma força misteriosa da natureza, talvez alguma conjunção astral havida em 1962, fazemos parte de uma pentelhonésima parte da humanidade que parece nunca precisar do outro. Somos, aos olhos de todos, umas fortalezas incorruptíveis, umas criaturas estóicas que passarão pelas vidas sem jamais necessitarem de quem quer que seja ou de algum cuidado em particular. E também por algumas dessas razões insondáveis, e no sentido diametralmente oposto, o resto dos homens e das mulheres, dos amigos, dos familiares, dos colegas de trabalho, dos cônjuges, dos namorados e etc (alguns desses homens e mulheres nem de tanta boa vontade assim) sempre precisarão de nós, e bem amiúde. Aliás, seremos por eles escolhidas como amigas ou namoradas ou cônjuges bem por esta percepção. Quando esse momento chegar, certamente será de nós que se lembrarão. Uma lacuna que se abre em suas vidas, um desacontecimento, alguma coisa ingrata os levarão a discar o número do celular que nos alcança. E, sim, nós estaremos lá. Certamente estaremos. Seremos atentas em tudo e por tudo às misérias alheias. Ouviremos suas aflições, teremos bons conselhos, a compaixão em nossos corações falará mais alto e jamais negaremos abrigo a quem quer que seja. O problema é que, às vezes, também precisamos nós de algum consolo, de algum colinho, ainda que colinho light, ou, apenas, de alguma interlocução ou de uma mera... atenção. Tudo isso lhes passará batido. Não por falta de comunicação ou de evidência, simplesmente não será percebido de nenhuma maneira. Sabe aquele telefonema simples, apenas para saber se vai tudo bem com o outro? Sabe aquele contato que não é para dizer nada em particular, mas para ouvir como vai a vida do outro? Não rola. Se alguém liga (a menos que para um convite ou outra frugalidade) é porque está precisando de algo. Diante de nossa constatação desalentadora, resolvi reformular meu velho conceito de amigo - "aquele de quem a gente não tem que se proteger", de resto muito mais um ideal do que um conceito - para "aquele que quer nos ouvir e saber de nós quando a sua própria vida estiver bem". Aquele que quer compartilhar não a alegria do encontro social ou qualquer outro contentamento pessoal, mas, tão-só, o simples saber da vida da gente. Não me acho sofisticada, tampouco complexa é a Marcia B, mas somos predestinadas a servir, a servir, a servir. A pergunta é: quem nos servirá, além de uma a outra? E não deveria ser a vida apenas e simplesmente gostar e gostar e gostar?

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