quinta-feira, junho 19, 2014

Vila Maria, Bicho de Pé e a verdadeira teoria da redução de complexidade





“Por que facilitar se é tão simples complicar?”, perguntou o jurista. Já ia tarde o seminário e havia meros gatos pingados, eu incluída, numa última palestra de último dia.  Quem resiste a uma maratona de dias sem fim com palestras longuíssimas rodeado de advogados e seus indômitos celulares?  Aquele finzinho era uma quase-benção e então contava o jurista (uma figura ímpar, culta e muito divertida) sobre sua primeira causa, cuja defesa, em 40 laudas, caprichava nas teses.  Confiante, perguntou a um ex-professor seu, juiz aposentado, o que dela achava, recebendo como resposta uma lição lapidar: “muito boa, mas nenhum juiz vai ler uma defesa de 40 páginas. Acho que merece uma redução de complexidade”, tendo pronunciado ‘redução de complexidade’ com as vogais bem abertas, já que o jurista era baiano. Dias depois ainda repercutia em mim aquela frase que, primeiro, virou um aforisma meio de brincadeira e, depois, uma espécie de teoria para tudo na vida. É isso, nada de sofisticações desnecessárias. Tem que ser justo. Tem que ser preciso.  Tem que ser simples. 
Desde então, não duvido estar diante de algo fadado ao sucesso quando me deparo com a materialização dessa teoria.  Foi o que me aconteceu ouvindo e vendo a banda Bicho de Pé: está tudo ali, tudo o que precisa haver de instrumental e vocal, verdadeira mmbb (música muito boa brasileira).  Dá vontade de ouvir até não mais poder.  Uma identidade tão grande senti que me dei conta que a brasilidade sopra de onde quer e alcança o que nem sempre espera (no caso eu mesma, carioca da gema, que me apaixonei pela banda do novíssimo ritmo 'xoxote'). O mais curioso é que a tal teoria da redução de complexidade, tão rara de acontecer, veio num só dia em dose dupla - horas antes, havia visto “Vila Maria”, peça em cartaz no Teatro Gonzaguinha até o fim do mês. Texto, direção e atores na justa medida da perfeita harmonia, como uma boa peça de teatro deve ser. Bem concebida do começo ao fim, vai fluindo redonda até fazer a plateia sentir pena quando acaba.  Essa teoria é tão escassamente vista na dramaturgia e, no entanto, bastam bons atores, um bom texto e uma boa direção.  Como tampouco são banais uma mulher bonita sem nenhuma maquiagem ou um corpo bem feito em que nada sobra e nada falta.
Confesso que foi um refrigério ver que ainda existe gente que percebe haver uma imensa força na simplicidade da cultura brasileira.  Foi mesmo redentor encontrar artistas que não quiseram reinventar a roda para revelarem ao mundo como são bons, como são geniais.   

Acho que foi uma benção, sobretudo, porque os tempos cá em Terras Brasilis andam para lá de complexos.