segunda-feira, outubro 23, 2023

sobre o luto

O luto é estranho, mas que não o estranhe - todo mundo passa por ele.  É uma tristeza que fica lá, à espreita, subjacente a todos os momentos do dia e, quando uma lembrança espoucar na mente, artimanha da memória talvez sádica, talvez aleatória, mas sempre necessária, o coração vai doer, e talvez venha uma lágrima, ou talvez venham muitas, e nem sempre vai ser possível disfarçar. 

Quando acharem que vc está bem, será quando você estará pior, porque ali o esforço para prosseguir estará sendo enorme.

O tempo muda no luto - ou a percepção dele. Ficam os dias morosos, enquanto as semanas voam.

O luto é sólido na dor, líquido nas lembranças, gasoso no que se esvai.  É um estado da matéria tanto quanto um estado da alma.

Todo luto tem também um pouco dos lutos precedentes.  Mas quem se acostuma com a dor?

O luto é estar nas mãos de Deus, sentir-se ligado ao que os olhos não enxergam e ao que o coração não duvida.  

O luto é o encontro do inevitável, da sina de todo ser vivente sobre a Terra, a reafirmar que a vida é aqui, agora, nos encontros que vamos tendo, casuais ou não.

O luto é um divisor de águas - os que estiveram e estão por perto, os que preferem não se envolver.  Ele é solitário como toda dor, mas não precisa ser um abandono.

E, o peito doendo, quando menos se esperar, uma alegria vai teimar em aparecer, porque a alegria dos entristecidos é até mais alegre.

O resto, é o tempo.








Na foto, meu pai, já no fim da vida, mas ainda não doente.  Ele havia se encontrado com uma amiga minha na rua casualmente e ela fez esse registro, que é bem a expressão dele. 

Nenhum comentário: